Despir-se não é ficar nu, mas vestir-se apenas de você

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segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

2015: OS NUDES DOS NÃO FAMOSOS

Nossa retrospectiva escolheu os mais interessantes e picantes do Instagram para esquecermos a falta de pudor no campo político-social 



Eles surgiram como proposta de fotografia caseira, para ser compartilhada da mesma forma. Mas em 2015 saiu da esfera privada e tomou conta das redes sociais, inclusive o Instagram (apesar da forte política contra fotos envolvendo nudez) evidenciando nosso lado exibicionista e voyeur. E todos seus pros e contras - infelizmente também serve de material  para mentes perturbadas de hackers, pedófilos e pessoas que lidam de maneira criminosa e nada saudável com a nudez. 

Mas vamos esquecer esses tristes episódios e focar no lado tesudo que a palavra sugere. Num ano marcado pelo fim da Playboy, pela falta de amor ao próximo e pela suruba política, fui atrás do lado sensual, engraçado e até inocente de anônimos em suas selfies de nudes que eles próprios tornaram públicas. Fotografar-se nu, ou quase, pareces ser, para muitos, um ato de liberdade ou de rebeldia (com doses de safadeza) no meio de todo esse caos.

Encontrei um vasto material, de todos os sexos, raças, classes sociais e aparentes opções sexuais - o que prova que os nudes são democráticos!

A maioria está concentrado em hastags com as palavras nudes/nude: #nudegirls #nudeman #nudesdelfie, etc. etc. O maior deles  #nude sofreu censura pela administradora da rede social e boa parte das fotos não pode mais ser visualizada. Mas ainda temos um vasto material à disposição.

Para a retrospectiva, foquei nas selfies e nas fotos 100% caseiras, ignorando os trabalhos específicos de fotógrafos profissionais e amadores em torno do tema, que foram muitos e belos em 2015. Afinal, a nudez com jeito mais natural voltou à moda, na contramão do perfil das fotos da Playboy. Evitamos com isso o constataste - apesar de alguns nudes caseiros surpreenderem pela qualidade e criatividade (vamos combinar que posar e segurar a câmera de celular, modelo tradicional dos nudes, não é algo tão simples).
 
Chamou a atenção o crescimento do número de selfies masculinas (posso fazer a comparação com anos anteriores porque esse item eu já acompanhava para meu deleite). Talvez demonstre uma redução da superexposição do corpo feminino ou maior igualdade de superexposições - apesar das mulheres ainda serem a grande maioria dos nudes do Instagram.

Uma coisa não dá para negar: somos (digo sexo feminino) muito mais criativas e alongadas nas fotos. (Que fique claro que não sou do tipo de feminista que é contra ou rotula esse tipo de experiência como exibicionista ou vulgar - minha postura vai completamente de encontro a essa teoria, a tirar pelo número de nudes que tiro, públicas e particulares, e ensaios de nu nos quais participei. E alguns podem ser vistos aqui).

Voltando ao tema. As fotos com nudes masculinos, com raras exceções, mostram pequenas variações das poses tradicionais de corpos sarados, que já nos acostumamos a ver na mídia (nada contra, mas podiam ser mais lúdicas e criativas. Procurei escolher as mais divertidas).  Já entre as mulheres encontrei maior variedade, para além das poses, nos tipos de corpos - seria  uma forma de liberdade e aceitação do corpo fora do padrão modelo? Talvez a divulgação de trabalhos de fotógrafos como Jorge Bispo, em Apartamento 302, tenham ajudado nesse sentido.

Mas nos dois casos as fotos são, na maioria, solitárias.

Enfim, vamos a seleção. Que toda nudez em suas diferentes formas seja apreciada. 

E que  2016 tenha mais nudes de corpos, mas também de almas!!

(Para evitar disseminar fotos não autorizadas ou qualquer tipo de crime, as mesmas são divulgadas junto com o autor da postagem. Tb procurei não divulgar fotos explicitamente voltadas para exploração da prostituição).
















domingo, 9 de agosto de 2015

QUE SEJAM FELIZES PARA...



Casei na igreja. Dia 02 de outubro de 1999. De véu e grinalda, vestido branco, daminha, padrinhos e tudo que um tradicional casamento católico oferece. E com trilha sonora executada por um belo grupo de chorinho, que já tinha acompanhado Pixinguinha e outros bambas. Entrei na Igreja ao som de nada menos que Rosa: "tu és, divina e graciosa
Estátua majestosa do amor
Por Deus esculturada
E formada com ardor
Da alma da mais linda flor
De mais ativo olor
Que na vida é preferida pelo beija-flor."

Só anos depois fui saber que a letra da valsa de Pixinguinha foi composta pelo mecânico Otávio de Souza, que morreu cedo e ficou conhecido apenas por essa música, popularizada na voz de Orlando Silva. Otávio foi morador do Engenho de Dentro, bairro que fica ao lado de onde eu cresci, Piedade. O fato me fez gostar ainda mais da música.

Mas voltando ao casamento. Como na letra, me senti majestosa entrando na igreja, com um vestido feito por uma grande costureira de SP (minha sogra morava em sampa e trabalhava nesse meio de casamentos) inspirado no de uma modelo famosa (mas que não lembro o nome), cujo casamento foi capa da revista argentina Hola. 

Achei-o ousado, era todo bordado, fechado na frente, mas com um cós que ia até a fenda do bumbum. O véu, preso na cabeça e na frente do vestido, emprestava pureza e diminuía o impacto do suntuoso decote. Pelo menos na cerimônia religiosa.

Apesar do vestido branco, eu não era mais virgem, mas poucos amigos (acho que nenhum, na verdade, nem o noivo, que só soube anos depois) imaginavam que eu tinha perdido a virgindade com o homem que me esperava no altar. Fui virgem além do tempo considerado normal para a época, ainda mais se tratando de alguém ousada, independente e nem um pouco tímida como eu. Disse virgem, não pura, pois já tinha feito sexo de outras maneiras que não me fizeram perdê-la. Longe do sonho de casar casta, na verdade tinha medo de engravidar, já que não podia usar pílula e a camisinha não era tão popular.

Aquela imagem de véu contrastava com a menina que se orgulhava da façanha de conseguir ser expulsa do Kabaré Kalesa, na Praça Tiradentes, um puteiro frequentado por jornalistas, que depois virou boate cult. Motivo: atentado violento ao pudor cometido junto com um go-go-boy da casa. Melhor voltar para as Rosas de Pixinguinha. 

A cerimonia foi linda, pela manhã, numa capela barroca de frente pro mar, numa praia de Niterói. Ou seja, com vista para o Rio. Não chorei, mas sem dúvida foi o casamento mais emocionante que assisti até hoje. Sem luxo, mas com estilo e personalidade. Capela pequena, repleta de amigos que madrugaram, muitos vindos de SP, para assistir às 10h da manhã de um sábado o enlace do que um colunista chamou de "Amor de Redação", título da nota que fez em nossa homenagem. 

Nos conhecemos no Jornal do Commercio, ele tinha acabado de entrar no jornal e eu estava saindo de férias. Parecia um anjo ao adentrar aquele jornal pela primeira vez. Cabelos longos dourados e terno bege claro - bem diferente do estilo dos jornalistas da época. Em poucos minutos já tinha um bolão de apostas para ver quem seria a felizarda que iria conquistar o príncipe. Ou cair nas suas garras, dependendo do ponto de vista. Como sou afeita a disputas, cancelei as férias e parti para o ataque. Em menos de uma semana estávamos namorando e, poucos anos depois, no altar. Sonho romântico que nunca esteve nos meus planos de vida.

Apesar do dia amanhecer com sol, choveu durante a cerimônia, o que, segundo a crença popular, significa sorte e vida longa à união.

Vida longa. Sorte. Dez anos se passaram e o casamento acabou.  Com ele, o estigma do "não ter dado certo", imposto pela sociedade. Ainda mais quando o rompimento é brusco e parte do lado feminino.

Desde então, sempre senti um peso por ter contrariado os preceitos daquela chuva no meio da cerimônia. Era como se nunca tivesse parado de chover, na minha cabeça.

30 de julho de 2015 fui assistir a peça 2 Casamentos, 
adaptação teatral de Luiz Rosemberg Filho para seu filme homônimo. Já tinha ido à estréia do filme, mas no meio de tanta gente e na correria que foi o dia naquela data, não me atentei tanto para o belíssimo texto e me fixei apenas na poesia estética. Já no teatro, mergulhei na história.

No roteiro, duas noivas refletem sobre o casamento, enquanto aguardam serem chamadas para o início de suas respectivas cerimônias. Uma tenta ver o lado romântico do casamento enquanto a outra convencê-la do quanto o casamento tradicional está atrelado ao comodismo de uma vida burguesa e sem sonhos. Bela analogia à vida e seu grande dilema de liberdade.

- Quem quiser pérolas, diamantes e esmeraldas que se vire. Eu to mudando.
- Mas o casamento não é só isso Dona Carminha.
- Não, não é só isso. É isso e mais o fim do desejo, da febre, a doença incurável.
- Que doença?
- Da solidão a dois.

De repente, a chuva na minha cabeça cessou. Chegando em casa, resgatei os negativos da cerimônia, que nunca tinham sido revelados, e estavam encaixotados. 

Pude então finalmente entender o verdadeiro significado daquela chuva. 

Obrigada Ro. 







fotos: meu casamento, arquivo pessoal
Link trailer do filme 2 Casamentos, de Luiz Rodemberg Filho

http://youtu.be/JW2EvhocB9c




sexta-feira, 24 de julho de 2015

SER LOLITA É POP




(...) Ela tinha um nenúfar em seus cachos e era tão graciosa como uma mulher. Com ternura os mamilos dela floresceram, e lembrei-me a Primavera da minha vida na terra.

A descrição de uma menina sexualmente atraente, feita pelo escritor russo Vladimir Nabokov, no poema Lilith, em 1928, que teria inspirado o clássico Lolita, publicado por ele anos depois, nunca esteve tão atual no Brasil, mesmo em meio à moda de corpos sarados, tatuados e siliconados. 

O interesse de homens por meninas bem
mais jovens, as chamadas ninfetas, sempre fez parte do imaginário masculino e consequentemente inspiração para o mundo das artes. Em pleno século 21, contudo, ganhou contornos mais populares. 

Mesmo insinuando algumas vezes incesto e certa dose de pedofilia (que fique claro que sou contra pedofilia), a postura parece não ser considerada algo mais tão absurdo. E escondido. Ao contrário: ser e gostar de Lolita nunca foi tão pop.

Exemplos estão na ficção, a tirar pelas várias novelas que remetem ao tema (a mais recente, Verdades Secretas, mergulha totalmente na trama de Nobokov), na música, com as chamadas "novinhas" do cenário funk, nas revistas de moda e, como não poderia faltar, nos filmes pornôs - segundo estatísticas dos sites, as páginas das ninfetas são as mais acessadas. A ponto de ter subcategorias: colegiais, taradas, enteadas (para citar as menos pesadas). A popularidade pode ser medida inclusive pelo universo de mulheres que hoje opta pela depilação íntima total, no intuito de parecer com uma ninfeta e satisfazer o desejo masculino.

Bem diferente do cenário dos precursores do tema. O livro Lolita, que conta a história de um professor de meia-idade obsessivamente apaixonado por sua enteada, uma menina de 12 anos, e seus desdobramentos trágicos, foi rejeitado por quatro editoras norte-americanas que o consideravam indecente e pornográfico. Lolita só veio a ser publicado na França, em 1955. E apesar de Nabokov ter uma longa carreira como escritor em língua russa, foi originalmente escrito em inglês. 

Já a adaptação feita para o cinema por Stanley Kubrik, em 1962 - existe outro filme de Adrian Lyne, mais recente - teve que ser reescrita. Ele tentou diminuir o impacto ao aumentar a idade da personagem e escolheu uma atriz na idade adulta para o papel, Sue Lyon. Mesmo assim, a Lolita de Kubrick não deixou de provocar reações.

E a saída encontrada pelo diretor não agradou Nabokov, que tinha um conceito bem definido para ninfeta - palavra surgida com o próprio romance, a partir do termo mitológico ninfas, para classificar o estereótipo de menina adolescente sexualmente hiperdesenvolvida e sedutora. Nove e 14 anos seriam os extremos das idades para classificá-las. Ou seja, nove anos era considerada quase muito nova e 14 quase muito velha.

As ninfetas popularizadas hoje também usam do artifício de Kubrick para serem aceitas pela sociedade e evitar acusações de estímulo à pedofilia - estão entre 16 e 18 anos, idades na qual são vistas dentro da chamada "maioridade sexual" (ainda que perante a lei sejam menores de idade).

Num universo no qual as meninas se desenvolvem sexualmente cada vez mais cedo, as Lolitas tendem a se proliferar. A minha experiência foi ao estilo Kubrick, aos 15 anos. E sem os contornos trágicos do romance de Nabokov. Mas com a malícia típica de uma ninfeta. Que acredito ter mantido até hoje.

O que o tempo e nem a ficção não conseguiram desvendar são os motivos de tamanho fascínio. Simples fantasia ou depravação? Não cabe a esse espaço julgar, ainda mais sendo algo tão subjetivo. No caso do personagem do romance de Nabokov, o trauma por ter perdido uma paixão na infância foi a explicação

Necessidade de reviver a juventude, vaidade. Há quem diga preferir as  "novinhas" devido à aparência física delas, ainda cheia de frescor. Outros dizem ser a anatomia do órgão genital de mulheres mais jovens, considerado bem mais "apertado".

Eu poderia arriscar uma lista de motivos, mas vou deixar vocês pensando no tema. 










Fotos (por ordem):

Retrato de nu, olhar da fotógrafa alemã Ellen von unwerth

Camila Queiroz, atriz que interpreta a personagem Angel, na novela
Verdades Secretas (Brasil)

Mariana Ruy Barbosa, a Sweet Child da novela Império

As Lolitas do cinema, na versão de Stanley Kubrick e  
Adrian Lyne.

















 

 

  



 






 

quarta-feira, 15 de julho de 2015

MINHA VIDA DEPOIS DO NU


Esse era o título da capa da revista Manchete de 8 de abril de 2000. Por coincidência, me deparei com a revista na véspera de um ensaio que aceitei fazer para o fotógrafo Jorge Bispo - algo livre, para portfólio. Na matéria, atrizes, celebridades e subcelebridades da época, como Xuxa, Myrian Rios, Feiticeira, Tiazinha, Carla Perez e a sem-terra Débora Rodrigues, entre outras, falavam sobre a experiência de se despirem à frente das câmeras, ou quase, para publicações comerciais como Ele Ela e Playboy - as principais da época.
Com exceção de Xuxa, contratada da Globo, que por motivos óbvios não deu entrevista, e a atriz Myrian Rios, que teve um terrível surto de amnésia e disse não lembrar ter sido a capa da Ele Ela, todas falavam com orgulho do trabalho e o quanto ele teria impulsionado profissionalmente e financeiramente (teve até quem conseguiu, com o cachê, comprar apartamentos em áreas nobres do Rio e de São Paulo) suas carreiras.



Dez anos depois, me fiz a mesma pergunta imaginando as últimas capas e ensaios envolvendo esse tipo de trabalho. Obviamente não me refiro a experiências de cunho mais autoral. Falo dos ensaios artísticos com pegada comercial, que muitas feministas criticam - o que não é meu caso.
Para minha surpresa, numa rápida zapeada pelas emissoras de tevê à noite, encontrei algumas respostas. Num programa de auditório, ex-modelos, subcelebridades e artistas que ganharam algum destaque, muitas apenas por conta dos ensaios, falavam com desdém de terem feitos trabalhos desse tipo. "Não sei onde eu estava com a cabeça quanto topei, acho que eu era muito inexperiente na época", afirmava uma ex-BBB, ao mesmo tempo que tentava segurar a saia arroxada no corpo, que insistia em subir e deixar bem evidente suas acentuadas curvas.
Assim como ela, outras moças de pouca roupa diziam não entender como foram capazes de "tamanha ousadia".



Me senti a mais despudorada das mulheres - afinal já tinha feito um ensaio para o site Paparazzo e três ou quatro outros para trabalhos de amigos. E estava prestes a encarar mais um. Em todos me entreguei sem nenhum pudor - afinal essa era a proposta. 

Um parênteses: num trabalho como esse não rola uma grande suruba onde todos transam a cada intervalo das fotos. São trabalhos profissionais onde todos estão preocupados com o resultado - e isso envolve equipe e muitos detalhes técnicos. Também sinto informar que as pessoas não cheiram carreias de pó para se sentirem mais soltas - pode cheirar quem quiser, assim como em outras profissões (em mercado financeiro, vi muito), mas isso não é pré-requisito para um ensaio.

Da parte da(o) modelo, o que rola é uma grande magia, uma sensação de liberdade, de se despir de modismos, preconceitos e até as imperfeições do corpo são esquecidas depois do terceiro clique. E se rolar química com o fotógrafo, daí é como uma boa trepada - no lado poético da palavra, sem toque. E o resultado pode ser percebido nas fotos.

Mas se é tão bom porque tanto preconceito? Infelizmente, essa onda de conservadorismo que assola o país, na contramão de toda a suruba social e política, desvaloriza esse tipo de trabalho, assim como quem o faz.



Ao contrário da matéria da Manchete, hoje um ensaio não compra nem uma charrete e ainda joga para uma certa "lista negra" das agências de publicidade as modelos que têm essa experiência no currículo. Poucos sabem, algumas empresas, principalmente bancos e indústrias de produtos de beleza, têm em seus contratos de publicidade cláusulas que impedem a contratação, para suas peças publicitárias, de modelos que já fizeram algum ensaio de nu. Senti isso na pele a ponto de ter que criar um outro nome artístico para ser aprovada em alguns trabalhos - e fui, com novo nome, tamanha é a hipocrisia. Outro parênteses: estão incluídas nesse grupo de empresas, algumas que hoje fazem marketing anti-preconceito, com propagandas que dão destaque a, por exemplo, relacionamento entre pessoas do mesmo sexo - numa jogada totalmente oportunista e que esconde seus reais valores.

Em resumo, vivemos numa sociedade onde todos são santos e virgens. Mesmo que do Paoco, não importa. Prefiro pensar como a designer e modelo Anne Mantovani, no belo texto, intitulado Posei nua e daí?, que escreveu para um blog feminino. E continuar fazendo o que bem entender com o meu corpo, mesmo que deixe de ser a garota propaganda de um grande banco. Ah, acho que rolou química no ensaio, pois achei o resultado lindo, que publico aqui, com muito orgulho, em primeira mão.



"Quero mostrar para sociedade que meu corpo não é ofensivo. Que a nudez é a forma mais natural do ser. Quero que as pessoas enxerguem o corpo como arte, ou minimamente, como um simples corpo, sem agregar elementos ou concepções sujas a respeito. E mesmo que seja pornográfico, o sexo é natural."

Que jogue a primeira calcinha quem nunca teve vontade de fazer ou de ver. 

APN

Fotos Jorge Bispo
Capa Revista Manchete









 

terça-feira, 7 de julho de 2015

PUTAS, SE NÃO SOMOS, SOMOS FILHOS


Em tempos de Book Rosa, onde mulheres que vendem o corpo se escondem sob o título de "modelo", tornando ainda maior o preconceito para com a profissão, lembrei da polêmica que gerou o título do meu curta "As últimas putas de Paris" (trailer: http://youtu.be/lNtYCeP03kg), com os relatos das lembranças de mulheres que trabalhavam em um dos prostíbulos mais antigos do Rio de Janeiro, o Hotel Paris, na sua última noite antes de fechar. 

"O filme é lindo, só não entendi porque quis nos chamar de puta no título", exclamou uma das personagens, a mais antiga do Hotel Paris, que em seus depoimentos mostrava orgulho em trabalhar como prostituta.

Na hora, fiquei sem muita resposta. Decidi pelo nome antes mesmo de começar as filmagens e ao pesquisar sobre elas. Quis fazer uma alusão ao título do filme "O último tango em Paris", por conta da semelhança sonora e por conter cenas quentes. Ao mesmo tempo, achava a palavra puta forte, à altura daquelas mulheres que lá encontrei.

Mas nunca tinha me passado pela cabeça o quanto o termo puta era ofensivo para algumas delas - talvez a maior parte do universo de mulheres que trabalham com prostituição.

Desde então, não parei de pesquisar sobre o tema. E lembrei, com o assunto das modelos prostitutas em evidência, de falar sobre ele. Pouco se discute até hoje, de forma séria, não só no Brasil, sobre a profissão, considerada a mais antiga do mundo. O estigma em relação às prostitutas infelizmente impede que elas tenham os mesmos direitos que qualquer outra trabalhadora brasileira.

Para quem não sabe - e isso inclui muitos que utilizam o serviço, homens e mulheres - prostituição individual é legalizada, desde 2002, no Brasil (o que não inclui menores de idade), mas a profissão não é regulamentada. É crime, descrito no Código Penal, o uso de espaços privados como locais de troca de sexo por dinheiro, o que joga as profissionais para o submundo, já que oficialmente não podem sequer usar seus apartamentos. A criminalização dos locais de prostituição fomenta a corrupção, já que as casas, registradas com nomes de clínicas ou boates, acabam pagando propina para Governo, policiais ou bandidos (ou todos juntos). E criam a figura do cafetão - com todo seu aspecto negativo.

Na prática,  a profissão é considerada politicamente ilegítima. O tema só costuma ser lembrado, em junho, quando, no dia 02, se comemora o Dia Internacional das Prostitutas, conhecido como Puta Dei. A data é marcada desde 1975, quando as profissionais do sexo fizeram um grande movimento, por seus direito, em Lyon, na França, em 2 de junho de 1975. (Vejam o lindo documentário La Révolte des prostitués de Saint-Nizier, de Eurydice Aroney e Julie Beressi).


Até hoje, no Brasil, pouco se avançou em termos de lei. A primeira tentativa de inserir a pauta na Câmara, feita pelo ex-deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), com o PL377/2011, durante o seu mandato (1995-2011), teve seu documento arquivado logo depois de o parlamentar deixar o cargo.

E o retorno das prostitutas à mesa de debate voltou apenas em 2012, com Jean Wyllys (PSOL-RJ), no Projeto de Lei Grabriela Leite - nome da fundadora da Daspu, movimento cultural e de protesto criado em 2005. (Ao contrário da maioria da classe, Gabriela sempre defendia, com orgulho, a palavra Puta. Segundo ela, o nome Daspu, significava "'de + a = das' e 'pu'  somos nós").

Só que, mesmo com o esforço da Daspu, entramos em 2015 e nada foi aprovado. Enquanto isso, trabalhadoras sexuais pagam 20% do que ganham em impostos, mas não têm nenhum benefício garantido pelas leis trabalhistas. “Pagamos impostos, e quem se beneficia? A sociedade. Toda sociedade é cafetina, e o governo é o grande dono do puteiro", disse Indianara Siqueira, prostituta e ativista digital, em uma entrevista recente à revista Carta Capital.

Em resumo, não somos Puta, mas parecemos ser todos filhos de uma - no sentido pejorativo do termo. Espero que essa realidade mude e que o título do meu filme ainda sirva de orgulho para essas mulheres.

Com a palavra, Gabriela Leite. Imperdível.


Fotos
Mata Hari (arquivo livre)
Bastidores As últimas putas de Paris




segunda-feira, 29 de junho de 2015

O PODER DE UMA BIRKIN COR DE ABÓBORA

Nunca pensei em ter uma Birkin. Não sou dessas de me deixar levar por grife e estou longe de ser uma fashionista - prefiro ser do grupo das estilosas. Mas quando vi aquela bolsa cor de abóbora, numa loja em Paris, foi amor à primeira vista.

Me custou os olhos da cara - não lembro ao certo, mas algo em torno de 40 mil reais. Na verdade, quem comprou foi uma amiga, que viajava a trabalho comigo, mas ela acabou revendendo a bolsa para mim, dias depois, de tanto que eu insisti, e ainda fez um desconto pois já a tinha arranhado.

Para quem não sabe, Birkin é um modelo ícone da grife francesa Hermès, que leva esse nome inspirada na modelo e atriz inglesa Jane Birkin (aquela linda, que aparece em fotos sensuais com um de seus maridos, o cantor Serge Gainsbourg). Ela vivia viajando de avião com uma bolsa de vime, aberta, parecendo um cesto, até que um dia esbarrou com Jean-Louis Dumas-Hermès, dono da marca à época, viu todas as suas coisas cairem no chão, e reclamou com ele que sofria tentando encaixar sua bolsa no compartimento de bagagens de mão do avião. Meses depois, recebeu o primeiro modelo de Birkin em sua casa.  A Birkin é feita completamente à mão, num único corte de couro que não pode conter uma imperfeição, num trabalho que pode levar de três dias a duas semanas para ser completado. Sem falar no tempo para encontrar o couro ideal.

Assim, diz-se que a produção da Birkin está diretamente relacionada aos humores da natureza.
Os da natureza eu não sei, mas o se seu uso pode alterar completamente os dos "humanos".

Com a mudança de SP/Lisboa para a Rio, em conjunto com a troca de profissão, de executiva para produtora de cinema, modelo e atriz - e consequentemente uma revolução no visual, com oito novas e significativas tattoos (só tinha duas muito pequenas e escondidas) -, ela acabou esquecida no armário. Até ressurgir como protagonista de uma história típica dos folhetins novelistas.

Instalada e com vida nova no Rio, comecei a namorar o filho de um banqueiro da alta sociedade. Ia tudo super bem com o namoro até eu descobrir que as minhas tattoos, misturadas ao meu jeito independente e descolado (e olha que ainda não tinha feito o Toplessaço e nem ensaio nu), e a falta de um sobrenome tradicional, eram motivo de bullying por parte da família e dos amigos mais próximos dele. Ele chegou a me dizer que, de fato, no seu universo as mulheres não tinham tatuagem. E que se eu tivesse um sobrenome de peso, poderia até compensar. Mas não era meu caso.

Como assim, em pleno século 21? E o rapaz tinha apenas 30 anos. 

A mãe só me chamava de "a mulher tatuada" e nem o fato de ter sido jornalista de mercado financeiro - inclusive já tinha entrevistado o pai dele - aliviavam a imagem que faziam de mim. Apesar de nunca ter dado importância à opinião alheia, fiquei chocada com o preconceito. E com a covardia do namorado diante da situação. Namoro em crise, um certo dia achei a Birkin no fundo do armário e resolvi colocá-la novamente em uso. Mas sem nenhuma pretensão.

Para minha surpresa, aquela peça em couro inteiriço - que só tinha um pequeno arranhão -  apagou, como um liquidpaper todas as minhas tattoos. E me deu um novo sobrenome. Do cabeleireiro, passando pelo dono do restaurante que frequentávamos, os amigos e até a "sogra", deixei de ser "a mulher tatuada" para ser "a menina da Birkin cor de abóbora".

Às vezes acho, tamanha a loucura, que eles pensam até hoje eu ser outra mulher. Nem o fato de ter virado a Musa do Topless parece ter mudado essa nova imagem.

O que essas pessoas não sabiam é que a mulher que eles tanto desprezaram era autêntica. Já a Birkin, fui descobrir só há poucos meses, falsa, apenas uma réplica perfeita.

Obs: lógico que o namoro acabou dias depois. E a Birkin virou minha companheira inseparável.